terça-feira, 15 de novembro de 2011

Informativo Jurídico - 15.NOV.2011


LEGISLAÇÃO

Lei Complementar nº 139, de 10.11.2011 - Altera dispositivos da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006, e dá outras providências.

Decreto nº 7.602, de 7.11.2011 - Dispõe sobre a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho - PNSST.

Decreto nº 7.601, de 7.11.2011 - Estabelece a aplicação de margem de preferência nas licitações realizadas no âmbito da administração pública federal para aquisição de produtos de confecções, calçados e artefatos, para fins do disposto no art. 3o da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993.

Decreto nº 7.594, de 31.10.2011 - Altera o Decreto no 6.170, de 25 de julho de 2007, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse.


NOTÍCIAS (Fontes: informativos do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça)

Fixação de salário mínimo por decreto do Poder Executivo é constitucional
Por oito votos a dois, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quinta-feira (3), a constitucionalidade do artigo 3º da Lei 12.382/2011, que atribui ao Poder Executivo a incumbência de editar decreto para divulgar, a cada ano, os valores mensal, diário e horário do salário mínimo, com base em parâmetros fixados pelo Congresso Nacional.  A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta da Inconstitucionalidade (ADI) 4568, ajuizada em março pelo Partido Popular Socialista (PPS), pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e pelo Democratas (DEM).  Alegações  Os partidos políticos argumentavam que o dispositivo impugnado é inconstitucional por ofender, “claramente, o disposto no artigo 7º, inciso IV, da Constituição Federal (CF)”, que determina que o salário mínimo seja fixado em lei. E, sustentavam, que a CF exige “lei em sentido formal”.  Alegavam, também, que a norma impugnada, ao delegar ao Poder Executivo o estabelecimento do valor do salário mínimo por decreto, entre os anos de 2012 e 2015, o faz com exclusividade, sendo que “o Congresso Nacional não poderá se manifestar sobre o valor do salário” nesse período.  O advogado Bernardo Campos, que atuou na sessão de hoje em nome dos autores da ADI, sustentou, ainda, que o salário mínimo tem componentes políticos, econômicos e sociais que transcendem o mero cálculo matemático. Daí a importância de o mínimo ser debatido pelo Congresso e editado por lei.  Relatora  A maioria acompanhou o voto da ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, segundo a qual o decreto presidencial de divulgação anual do salário mínimo é mera aplicação da fórmula, do índice e da periodicidade para ele estabelecidos pela Lei 12.382/2011. “A Presidente da República não pode aplicar índices diversos da lei aprovada pelo Congresso”, observou a ministra. “A lei impôs a divulgação do salário mínimo conforme índices fixados pelo Congresso”, ponderou a relatora.  A ministra endossou o argumento da Procuradoria-Geral da República (PGR), da Presidência da República, por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), da Câmara e do Senado de que não se trata de delegação de poder autônomo para o Poder Executivo fixar o valor do salário mínimo, mas tão somente da atribuição de, obedecendo os parâmetros fixados pelo Congresso Nacional na Lei 12.382, de fevereiro deste ano, calcular matematicamente o valor do salário mínimo.  Ainda segundo ela, a não divulgação do salário mínimo pelo Poder Executivo traria insegurança jurídica, pois qualquer outro órgão ou a imprensa poderia divulgá-lo, aplicando a fórmula determinada pelo Congresso, porém com risco para a credibilidade, pois não seria uma divulgação oficial.  Ela rebateu o argumento de que, para que o Executivo tivesse a faculdade de divulgar o valor do mínimo, haveria necessidade de uma lei delegada. Segundo ela, a Lei 12.382 é uma lei ordinária, que pode ser revogada ou modificada já no ano seguinte à sua edição, não engessando o poder do Congresso de deliberar sobre o assunto.  Votos  No mesmo sentido da relatora votaram o ministro Luiz Fux, o ministro Dias Toffoli, o ministro Ricardo Lewandowski, o ministro Joaquim Barbosa, o ministro Gilmar Mendes, o ministro Celso de Mello e o ministro Cezar Peluso. Segundo os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli, a lei impugnada não dá ao Poder Executivo discricionariedade para fugir da lei aprovada pelo Congresso e sancionada pela presidente da República.  “A qualquer momento, em 2012, poderá ser proposta alteração do dispositivo do artigo 3º. Portanto, o Congresso não está alijado do debate sobre a política do salário mínimo”, observou o ministro Dias Toffoli. No mesmo sentido, o ministro Ricardo Lewandowski disse que o decreto de fixação do salário mínimo “tem natureza meramente administrativa, é um ato declaratório, que não cria direito novo”.  Ao votar no mesmo sentido, o ministro Joaquim Barbosa observou que “não há qualquer inconstitucionalidade a ser declarada. O conteúdo decisório se esgota na norma (Lei 12.382/2011)”. Também o ministro Celso de Mello, que acompanhou essa corrente, afirmou que o decreto de divulgação do mínimo “é um ato meramente declaratório, não constitutivo de situação nova, sendo vinculado aos parâmetros da Lei 12.382”.  Divergência  O ministro Carlos Ayres Britto abriu a divergência, votando pela procedência da ADI. Ele entende que o artigo 7º, inciso IV, da Constituição exige uma lei anual para edição do salário mínimo, debatida e aprovada pelo Congresso Nacional para posterior sanção pela presidência da República. No mesmo sentido votou o ministro Marco Aurélio.  Outros dispositivos  Também acompanhando o voto da relatora, o presidente da Suprema Corte, ministro Cesar Peluso, declarou, entretanto, que os parágrafos 2º e 3º do artigo 2º da Lei 12.382 conteriam flagrante inconstitucionalidade, ao prever delegação de poder, e propôs que o Plenário avaliasse se não deveria apreciar o tema, embora não fosse suscitado pelos autores da ADI.  O parágrafo 2º estabelece que, na hipótese de não divulgação do INPC referente a um ou mais meses compreendidos no período do cálculo até o último dia útil imediatamente anterior à vigência do reajuste do salário mínimo, o Poder Executivo deve estimar os índices dos meses não disponíveis.  Por seu turno, o parágrafo 3º dispõe que, “verificada a hipótese de que trata o § 2º, os índices estimados permanecerão válidos para os fins desta Lei, sem qualquer revisão, sendo os eventuais resíduos compensados no reajuste subsequente, sem retroatividade”.  Colocada em votação, a proposta não foi aprovada pela maioria, quer porque não constava do pedido inicial feito pelos partidos políticos, quer porque não foi apreciada previamente pela PGR e pela AGU, ou ainda por julgar que também ela encerrava comando emanado pelo Congresso Nacional, não eliminando pronunciamento do Legislativo. Neste ponto, o voto do ministro Cezar Peluso foi acompanhado pelos ministros Ayres Britto e Marco Aurélio.

Falta de citação permite que execução iniciada sob regime anterior prossiga com base na lei nova
A multa de 10% por atraso de pagamento determinado judicialmente, prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil (CPC), pode ser aplicada se a execução foi iniciada antes de sua entrada em vigor, mas ainda não houve a citação do executado. O entendimento foi dado pela maioria da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em recurso movido por empresa de construção contra o Banco do Estado de Santa Catarina (Besc).  A empresa entrou com ação de execução de sentença que havia condenado o banco a lhe pagar aproximadamente R$ 277 mil. O trânsito em julgado da sentença e o protocolo da ação de execução ocorreram antes de 22 de junho de 2006, quando entrou em vigor a Lei 11.232/05 – que instituiu a execução como fase adicional do processo de conhecimento e criou a multa do artigo 475-J.  Como, na data de vigência da Lei 11.232, o banco ainda não havia recebido a citação, a empresa credora pediu que a execução fosse processada de acordo com as novas regras. O juiz, levando em conta a regra do CPC segundo a qual as leis processuais têm eficácia imediata desde sua entrada em vigor, atendeu ao pedido e determinou a intimação do devedor para que cumprisse a sentença, informando que a multa do artigo 475-J incidiria após o decurso do prazo.  A instituição financeira alegou que a multa não se aplicaria ao caso, pois a lei que a instituiu só entrou em vigor depois de a sentença transitar em julgado. Como seus argumentos não foram aceitos em primeira nem em segunda instância, o banco recorreu ao STJ, insistindo na tese da inaplicabilidade da multa, inclusive porque a execução também já havia sido iniciada antes da Lei 11.232.  O relator, ministro Luis Felipe Salomão, considerou que, como ainda não havia ocorrido o efeito prático da condenação, todos os instrumentos legais disponíveis para julgadores e as partes para fazer valer o julgado podem e devem ser utilizados. “O processo é instrumento por meio do qual a jurisdição opera com vistas a eliminar conflitos e realizar a justiça no caso concreto. Não é estático, desenvolvendo-se de modo sequencial e progressivo”, afirmou.  O ministro Salomão observou que o direito processual civil não tolera resistência do devedor ao cumprimento da decisão judicial, sendo esse o motivo da criação da multa do artigo 475-J do CPC: a diminuição da inadimplência.  Critério objetivo  Segundo o relator, há precedentes do STJ autorizando a aplicação da nova lei nas execuções que se iniciam sob sua vigência, mesmo que a sentença tenha transitado antes. Porém, no caso em julgamento, o protocolo da petição de execução foi anterior à mudança da lei, mas o executado ainda não havia sido citado. A questão, de acordo com o ministro, era “delimitar a partir de que momento ou até quando é cabível aceitar a incidência da nova lei” se a execução começou sob a vigência da legislação anterior.  Conforme os precedentes do STJ, caberia ao juiz, avaliando cada caso, decidir se a multa é ou não aplicável. No entanto, segundo Luis Felipe Salomão, esse critério “gera insegurança jurídica, face à abertura de um leque de possibilidades processuais subjetivas, quando em verdade o procedimento adotado deve ser único e aplicável a todos que se encontrem na mesma situação processual”.  A partir da Lei 11.232, a execução deixou de ser ação autônoma e passou a ser uma etapa do cumprimento da sentença, aproveitando a relação processual já estabelecida na fase de conhecimento. Por isso, segundo o relator, “há que levar em conta a citação do executado, no âmbito do sistema de execução anterior, para se caracterizar como vedada a aplicação da nova lei” – afinal, era a citação do devedor que dava início à nova relação processual (autor, juiz e réu), enquanto agora a execução de título judicial, de modo geral, dispensa nova citação.  Para Salomão, a citação “é o marco que deve servir de apoio à aplicabilidade ou não da multa do artigo 475-J do CPC a processo de execução iniciado sob a vigência da legislação anterior”. Desse modo, se a ação executiva começou antes da nova lei mas ainda não houve citação, o juiz pode – de ofício ou a requerimento do credor – convertê-la em cumprimento de sentença, adotando o novo ordenamento, inclusive a multa.  “Contudo, uma vez citado o executado pela sistemática processual anterior, não mais parece cabível a aplicação da nova lei, nem tampouco a incidência da multa”, afirmou o ministro, acrescentando que, com esse entendimento, “o critério subjetivo cede espaço a uma definição objetiva acerca de quando a lei processual alterada atinge os processos pendentes”.  Divergência  O ministro Antonio Carlos Ferreira concordou com o relator quanto à aplicação imediata das regras da Lei 11.232 nas execuções iniciadas sob a lei antiga, mas ainda não concluídas no momento de sua entrada em vigor. Discordou, porém, da incidência da multa nesses casos. “Existindo divergência e dúvida quanto à aplicação da multa, impõe-se levar em conta a menor onerosidade que rege a execução”, justificou o ministro.  Para Antonio Carlos Ferreira, independentemente do início do prazo para pagamento, o marco de existência da multa deve ser o trânsito em julgado da sentença condenatória, quando se forma o título executivo. Segundo ele, o princípio do devido processo legal não admite que a parte seja surpreendida com a imposição de multa que não estava prevista no momento do trânsito em julgado.  Além disso, ele sustentou que a multa, por não ser apenas norma processual – mas processual-material, pois gera efeitos além dos autos –, não deve ter incidência imediata, “diferentemente do que ocorre em relação às normas processuais típicas”.

Honorários advocatícios não podem ser arbitrados em execução provisória
Não cabe a fixação de honorários advocatícios no cumprimento de sentença quando esta se encontra ainda na fase de execução provisória. Esse foi o entendimento adotado pelo ministro Luis Felipe Salomão em recurso interposto por associação hospitalar do Rio Grande do Sul contra julgado que permitiu o arbitramento de honorários.  No recurso ao STJ, a defesa da associação reconheceu que os honorários podem ser cobrados na fase de cumprimento de sentença. Entretanto, sustentou, o momento processual não seria adequado, pois ainda havia recursos pendentes na ação.  O ministro Luis Felipe Salomão afirmou que o tratamento dado à execução provisória deve ser diverso da execução definitiva. Para o ministro, o artigo 475-O do Código de Processo Civil (CPC), que regula a execução provisória, determina que as execuções terão tratamento igualitário apenas no que couber.  Salomão também reconheceu a possibilidade da fixação dos honorários advocatícios durante o cumprimento de sentença, conforme regra introduzida pela Lei 11.232/05. “Não obstante, o que deve ser observado para a definição do cabimento de honorários advocatícios é o princípio da causalidade”, comentou.  Quem deve arcar com as verbas do advogado, lembrou o ministro Salomão, é quem deu causa à ação. Já a execução provisória é de iniciativa e responsabilidade do exequente e é ele que deve avaliar as vantagens deste pedido, até porque pode responder por danos causados ao executado.  “Aquele que experimenta a vantagem, permitida pela lei, de adiantar-se na fase de execução, não pode, por isso, prejudicar em demasia o devedor. Este, também por garantia legal, poderá aguardar o trâmite de todos os seus recursos para então efetuar o pagamento”, disse o relator.  O ministro afirmou que, por haver recursos pendentes, “a lide ainda é evitável e a ‘causalidade’ para instauração do procedimento provisório deve recair sobre o exequente”. Se o devedor se adiantasse e pagasse o débito, seria afastada a incidência dos honorários e da multa de 10% prevista no artigo 475-J do CPC.  O magistrado ressaltou que, se a execução provisória se tornar definitiva, nada impede que os honorários sejam arbitrados. Ele acrescentou que a Corte Especial do STJ já estabeleceu que não se aplica a multa do artigo 475-J durante a execução provisória, o que reforça a impossibilidade dos honorários nessa fase.  O recurso da associação hospitalar foi provido de forma unânime. No entanto, o ministro Antonio Carlos Ferreira, mesmo acompanhando o relator na solução do caso julgado – em que o devedor pagou sem impugnar a execução provisória –, sustentou entendimento diferente. Segundo ele, “o critério para a fixação do ônus da sucumbência não deve ser a natureza do cumprimento de sentença (provisório ou definitivo), mas sim a resistência por parte do executado”.  Para Antonio Carlos Ferreira, se houver impugnação ou recusa ao pagamento, os honorários devem ser arbitrados na execução provisória – “seja pela causalidade (decorrente do não pagamento espontâneo, demandando novos atos do exequente), seja pela sucumbência (no caso de impugnação afastada)”.  Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Contrato de locação não tem, por si só, força executiva para ser objeto de protesto
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso em mandado de segurança interposto pela Selal Negócios e Participações Ltda., que pretendia a anulação de ato que determinou o cancelamento do protesto de débito originário de locação predial urbana. A maioria dos ministros do colegiado entendeu não haver as delimitações da certeza, liquidez e exigibilidade imprescindíveis no contrato para que ele fosse sujeito a protesto.  A Selal interpôs mandado de segurança contra ato do corregedor-geral de Justiça do Estado de São Paulo, que tornou sem efeito permissão concedida para protesto de contratos de locação aos tabeliães de Protestos de Letras e Títulos da comarca da capital, inclusive determinando o cancelamento daqueles que foram lavrados durante a vigência da citada permissão – hipótese do caso em julgamento.  O Tribunal de Justiça de São Paulo negou a segurança por reconhecer a inexistência de direito líquido e certo e por entender que o contrato de locação não tem, por si só, força executiva para ser objeto de protesto. “Desde que expressamente não ficou estabelecido que o contrato de locação de imóvel deveria ser considerado título executivo extrajudicial hábil a ser protestado, não se pode dizer que o ato praticado violou direito da impetrante, sendo que foi dada interpretação viável ao assunto. Por via de consequência, não se enxerga direito líquido e certo a ser amparado pelo mandamus”, afirmou o TJSP.  No STJ, a Selal argumentou que a Lei 9.492/97 e a Lei Estadual 10.710/00 possibilitaram considerar o contrato de locação “outro documento de dívida” e, por consequência, sujeito a protesto.  Segundo a ministra Laurita Vaz, relatora do recurso, o STJ “possui jurisprudência remansosa no sentido de atribuir ao contrato de locação a natureza de título executivo extrajudicial”.  Ela disse que a melhor interpretação a ser adotada no caso em debate é aquela segundo a qual o legislador, quando estendeu, para além dos títulos cambiários, a possibilidade de protesto de outros documentos de dívida, “teve a intenção de fazê-lo também para abarcar os títulos executivos judiciais e extrajudiciais”, inclusive o contrato de locação. O desembargador convocado Adilson Vieira Macabu pediu vista.  Ao trazer seu voto, o desembargador divergiu da relatora. Segundo Macabu, é evidente que o contrato de locação de imóvel apresentado, “embora possa ser considerado título com o atributo da certeza, em decorrência da determinação cogente da norma legal, bem como demonstrar ser extensível sua condição de exigibilidade pela presunção de que houve o vencimento da dívida, seguramente não se reveste do atributo da liquidez, restando, assim, inviável a possibilidade de sujeitar-se ao instituto do protesto, como pedido pelo credor”.  “Com efeito, é possível o protesto de título extrajudicial, embora não de qualquer título, porquanto há a necessidade da liquidez e certeza da dívida, o que não se alcança em contrato de locação”, afirmou o desembargador convocado.  Os demais ministros do colegiado seguiram o entendimento do desembargador, que lavrará o acórdão.  Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Imóvel da família de réu condenado em ação penal pode ser penhorado para indenizar a vítima
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a penhora do imóvel da família de um homem condenado pelo crime de furto qualificado para pagar indenização à vítima. Os ministros reconheceram a possibilidade da penhora de bem de família em execução de título judicial decorrente de ação de indenização por ato ilícito.  A vítima no caso é uma distribuidora de alimentos. Após a condenação penal do réu pelo furto qualificado de mercadorias da distribuidora, cometido com abuso de confiança e em concurso de agentes, a empresa ingressou na esfera cível com ação de indenização de ilícito penal.  A ação foi julgada procedente para condenar o réu a pagar indenização correspondente ao valor das mercadorias desviadas, avaliadas na época em R$ 35 mil. Na execução, ocorreu a penhora de imóvel localizado da cidade de Foz do Iguaçu (PR), ocupado pela família do condenado.  O réu opôs embargos à execução pedindo a desconstituição da penhora sobre o imóvel, por se tratar de bem de família. Como o pedido foi negado em primeira e em segunda instância, veio o recurso especial ao STJ.  Efeitos da condenação  O relator, ministro Luis Felipe Salomão, ressaltou que o artigo 3º da Lei 8.009/90 (que trata da impenhorabilidade do bem de família) aponta as hipóteses excepcionais em que o bem poderá ser penhorado. Entre elas, o inciso VI prevê a penhora quando o bem tiver sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perda de bens.  Salomão explicou que a sentença penal condenatória produz, como efeito principal, a imposição de sanção penal ao condenado. Após essa sentença, surgem alguns efeitos que podem ser de natureza penal, civil ou administrativa. Nessas duas últimas esferas, os efeitos podem ser genéricos e estão previstos no artigo 91 do Código Penal (CP). O inciso I determina que se torna certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime.  Os efeitos genéricos são automáticos, segundo destacou o ministro. Isso significa que eles não precisam ser abordados pelo juiz na sentença penal. Ao interpretar o inciso I do artigo 91 do CP, Salomão afirmou que o legislador estabeleceu a obrigação de reparar o dano causado pelo crime, sendo desnecessária a prova do dano na área cível, pois já comprovado no processo criminal.  Penhora do bem de família  O relator apontou que a regra de exceção trazida pelo artigo 3º da Lei 8.009 decorre da necessidade e do dever do infrator de reparar os danos causados à vítima. Salomão reconheceu que o legislador não explicitou nesse artigo o caso de execução de título judicial civil, decorrente de ilícito criminal apurado e transitado em julgado.  Contudo, o relator ponderou que entre os bens jurídicos em discussão, de um lado está a preservação da moradia do devedor inadimplente e do outro o dever de ressarcir os prejuízos sofridos por alguém devido à conduta ilícita criminalmente apurada.  Segundo sua interpretação, o legislador preferiu privilegiar o ofendido em detrimento do infrator. Todos os ministros da Turma acompanharam o voto do relator, apenas com ressalvas dos ministros Raul Araújo e Marco Buzzi. Para eles, essa interpretação mais extensiva da lei deve estar sujeita à análise das peculiaridades de cada caso.  Coordenadoria de Editoria e Imprensa


JURISPRUDÊNCIA

AÇÃO DE SONEGADOS - EXISTÊNCIA DE CONTA BANCÁRIA DE INVESTIMENTOS E AÇÕES JUDICIAIS NÃO ELENCADOS NA RELAÇÃO DE BENS A INVENTARIAR - RESTITUIÇÃO - PERDA DA INVENTARIANÇA
- Restando demonstrado, nos autos, que a inventariante deixou de incluir dolosamente no rol de bens a partilhar conta de fundo de investimentos e ações judiciais de que o de cujus era o autor e que, portanto, poderão acrescer créditos, deve ser ela removida da inventariança e obrigada a restituí-los ao monte-mor.  (Apelação Cível n° 1.0024.06.237570-4/003 - Comarca de Belo Horizonte - Apelante: M.E.A.Z.J. - Apelados: F.G.J. e outro - Relatora: Des.ª Teresa Cristina da Cunha Peixoto)

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - RECUSA INJUSTIFICADA DE RECEBIMENTO DE CHEQUE EM SUPERMERCADO - RETIRADA DAS MERCADORIAS DO CARRO DO CLIENTE - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - INDENIZAÇÃO DEVIDA
- Para que se condene alguém ao pagamento de indenização por dano moral ou material, é preciso que se configurem os pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, que são o dano, a culpa do agente, em caso de responsabilização subjetiva e o nexo de causalidade entre a atuação deste e o prejuízo.
- No caso em exame, não há dúvida de que a recusa da ré, em receber o cheque emitido pelo primeiro autor, para pagamento das compras realizadas no supermercado, fazendo-o devolver as mercadorias que já se encontravam no interior do seu veículo, não se cercou de fundamento plausível, pelo que restaram configurados o ato ilícito, o nexo causal e o dano moral.
- O valor da indenização por danos morais deve ser fixado com razoabilidade, de modo a servir como compensação à vítima e punição ao ofensor, devendo-se evitar, por outro lado, que se converta em fonte de enriquecimento sem causa.  (Apelação Cível n° 1.0024.09.550034-4/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelantes: Alexandre de Sousa Bastos e outros - Apelada: DMA Distribuidora Ltda. - Relator: Des. Eduardo Mariné da Cunha)

CIVIL - PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE COBRANÇA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ADVOGADO NOMEADO COMO DEFENSOR DATIVO - EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA - DESNECESSIDADE - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR
- O advogado designado para oficiar como defensor dativo em processo judicial não está obrigado a exaurir a via administrativa para receber os honorários arbitrados em sentença transitada em julgado.
- A circunstância de o Estado não haver integrado a relação processual na qual foram arbitrados os honorários não o desobriga a indenizar o profissional, porquanto existem critérios objetivos estabelecidos pelo próprio Poder Público para o pagamento de tais verbas.
- Não influencia no dever de indenizar o fato de o advogado ter representado a parte autora, porquanto a vontade da lei é que os carentes de recursos - sejam autores ou réus - tenham acesso pleno à Justiça.  (Apelação Cível n° 1.0024.09.587985-4/001 - Comarca de Belo Horizonte - Apelantes: 1º) Clebson Teixeira da Silva - 2º) Estado de Minas Gerais - Apelados: Clebson Teixeira da Silva, Estado de Minas Gerais - Relator: Des. Alberto Vilas Boas)

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL - PRORROGAÇÃO DE PRISÃO DOMICILIAR - INVIABILIDADE - INSUBSISTÊNCIA DOS REQUISITOS QUE ENSEJARAM A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO - REGIME SEMIABERTO - RECOLHIMENTO PARA PERNOITES EM LOCAL PRÓPRIO PARA REEDUCANDOS DO REGIME ABERTO - INEXISTÊNCIA DE EXCESSO DE EXECUÇÃO E CONSTRANGIMENTO ILEGAL - RECURSO NÃO PROVIDO
- Inexiste qualquer excesso de execução ou constrangimento ilegal se, apesar de estar em regime semiaberto, por ausência de estabelecimento adequado, o reeducando cumpre a reprimenda de acordo com o disposto para o regime aberto, apenas pernoitando no estabelecimento prisional, que possui anexo próprio para recolhimento noturno.
- Constatando-se que não mais subsistem os requisitos que ensejaram a concessão da prisão domiciliar - gravidez de risco e alimentação da criança exclusivamente através de aleitamento materno -, inviável a prorrogação do benefício.  (Agravo de Execução Penal n° 1.0334.09.017512-9/001 - Comarca de Itapajipe - Agravante: Tatiele Aparecida da Silva - Agravado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Relator: Des. Herbert Carneiro)

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA - CITAÇÃO DO SÓCIO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA
- É necessária a citação do sócio para responder ao pedido de desconsideração da personalidade jurídica, quando presentes indícios para referida desconsideração, respeitando-se os princípios do contraditório e da ampla defesa.  (Agravo de Instrumento Cível n° 1.0024.02.795203-5/001 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante: Ricardo de Oliveira Felício dos Santos, em causa própria - Agravada: Construtora Modelo Ltda. - Relator: Des. José Affonso da Costa Côrtes)

PROCESSO CIVIL - DUPLICATA SEM ACEITE - EXECUTIVIDADE - REQUISITOS ESSENCIAIS - AUSÊNCIA - EFEITOS
- A teor da Lei nº 5.474/68, a duplicata sem aceite somente quando acompanhada de documento que comprove a entrega e o recebimento da mercadoria, bem assim do comprovante de protesto, é que constitui título executivo, pressupostos que compete ao exequente demonstrar por ocasião da propositura da ação sob pena de extinção do feito.  (Apelação Cível n° 1.0433.09.304851-3/001 - Comarca de Montes Claros - Apelante: Turmalina Comércio de Combustíveis Ltda. - Apelada: Floral W.B. Comércio Ltda. - Relator: Des. Saldanha da Fonseca)

AGRAVO DE INSTRUMENTO - REVISIONAL DE ALUGUEL - FIXAÇÃO - ALUGUÉIS PROVISÓRIOS - LEI Nº 8.245/91
- Apresentados elementos relevantes para a majoração do valor do aluguel, é direito do locador ter fixado aluguel provisório, correspondente ao valor trazido pelo laudo apresentado.
- A fixação deve ocorrer ao ser despachada a petição inicial, sem audiência da outra parte, desde que o autor a requeira, trazendo, ao ensejo, elementos idôneos que viabilizem o acolhimento de sua solicitação.  (Agravo de Instrumento Cível n° 1.0024.10.167541-1/001 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante: Armazém do Mar Ltda. e outro - Agravada: Jugurta Empreendimentos Imobiliários Ltda. - Relator: Des. Domingos Coelho)

AÇÃO DE USUCAPIÃO DE BEM MÓVEL - AQUISIÇÃO DE VÉICULO - BEM GRAVADO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - USUCAPIÃO - IMPOSSIBILIDADE
- Não se adquire a propriedade de veículo pelo usucapião se o comprador estava ciente da existência do gravame da alienação fiduciária, estando configurada a posse precária e a ausência de animus domini.  (Apelação Cível n° 1.0056.08.173691-2/001 - Comarca de Barbacena - Apelante: José Eleutério da Silva - Apelados: Renato Conceição da Rocha e outro, representado p/curadora especial defensora pública - Relator: Des. Osmando Almeida)

EMBARGOS DE TERCEIROS - PRELIMINARES AFASTADAS - PRÁTICA DE ATO ILÍCITO PRATICADO PELO VARÃO - PENHORA - BEM DE FAMÍLIA - IMPENHORABILIDADE DA MEAÇÃO RECONHECIDA PELO STJ - EMBARGOS DE TERCEIRO PROVIDO
- Nos termos do § 3º do art. 1.050 do CPC, inserido pela Lei nº 12.125, de 2009, passou-se a permitir a citação do embargado pelo seu procurador, devidamente constituído nos autos da ação principal.
- O efeito processual da revelia consiste na dispensa de intimação da parte, pelo que não há se falar em cerceamento de defesa ante a não intimação para apresentar provas.
- Tratando-se de execução fundada em ato ilícito do cônjuge, a meação da mulher não responde pela dívida decorrente do delito cometido pelo marido ante a ausência de prova inequívoca de que ela contribuiu para a prática de tal ato e de que tenha sido beneficiada com o produto da infração, devendo-se aplicar o art. 3º, VI, da Lei nº 8.009, de 1990.  (Apelação Cível n° 1.0079.10.037676-7/001 - Comarca de Contagem - Apelante: Sara Naira de Souza Lemos Parreiras - Apelada: Cristina Gouveia de Figueiredo - Relator: Des. Francisco Kupidlowski)

APELAÇÃO CRIMINAL - VIAS DE FATO - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO - IMPROCEDÊNCIA - INAPLICABILIDADE DA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS - AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA - AUDIÊNCIA PREVISTA NO ART. 16 DA LEI 11.340/06 - DESNECESSIDADE - PRELIMINARES REJEITADAS - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - IMPOSSIBILIDADE - VIOLÊNCIA COMPROVADA - INDENIZAÇÃO PREVISTA NO ART. 387, IV, DO CPP - NATUREZA MATERIAL - IRRETROATIVIDADE - CONDENAÇÃO DE OFÍCIO - DESRESPEITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA - DECOTE - RECURSO PROVIDO EM PARTE
- O fato de a agressão não constituir crime, mas sim contravenção penal, não afasta a aplicação da Lei 11.340/06. É sabido que, para a aplicação da referida lei, basta que esteja configurada a situação de violência doméstica, independentemente da classificação da agressão.
- A audiência prevista no art. 16 da Lei 11.340/06 somente se aplica aos crimes que se processam mediante ação penal pública condicionada à representação.
- A contravenção penal de vias de fato, praticada com violência doméstica, é perquirível por meio de ação penal pública incondicionada, sendo desnecessária a representação da vítima e incabível eventual retratação.
- A aplicação do princípio da insignificância não é admitida em nosso ordenamento jurídico, quanto mais aos atos ilícitos que envolverem violência contra a pessoa.
- Em todas as fases do processo penal, é assegurada ao réu a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa, nos termos do art. 5º, LV, da Constituição Federal, não podendo haver condenação de ofício na indenização prevista no art. 387, IV, do CPP.
- Por possuir natureza material, a indenização à vítima não pode retroagir aos fatos anteriores à sua vigência.  (Apelação Criminal n° 1.0016.08.078422-2/001 - Comarca de Alfenas - Apelante: Adenis Bruno das Chagas - Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Relator: Des. Alberto Deodato Neto)

MEDIDA DE PROTEÇÃO INTENTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM FAVOR DE MENORES - SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL - INTERESSE DE MENORES - LEGITIMIDADE - COMPETÊNCIA DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE - RECONHECIMENTO - DECISÃO QUE ARQUIVOU O FEITO - DESCABIMENTO - REFORMA
- Tendo em vista o disposto nos arts. 141 e 201, VIII, da Lei n° 8.069/1990 c/c art. 82, I, do CPC, o Ministério Público tem legitimidade para figurar no polo ativo de ação em que se pleiteia a adoção de medidas protetivas contra alienação parental.
- Conjugando-se o disposto no art. 98, II, com as determinações do art. 148, parágrafo único, d, ambos do ECA, tem-se a competência do Juízo da Infância e da Juventude para conhecer, processar e julgar medida de regulamentação de visita, que busca coibir alienação parental promovida pela mãe contra o pai.
- Impõe-se a reforma da decisão que determinou o arquivamento dos autos em que se pleiteou medida protetiva para menores, se restar verificado a plausibilidade de eles estarem em situação de risco, especificamente em síndrome de alienação parental.
Recurso provido.  (Apelação Cível n° 1.0114.10.014405-3/001 - Comarca de Ibirité - Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelado: M.A.V.C. - Relator: Des. Vieira de Brito)

sábado, 12 de novembro de 2011

DECISÃO – SAÚDE – DESOBEDIÊNCIA – FORÇAS ARMADAS – 2ª VARA DE JUÍNA/MT


O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ingressou com a presente medida de proteção em favor da criança V.E. de apenas 2 (DOIS) anos de idade, residente nesta Comarca de Juína, portadora de hidrocefalia e necessitando de neurocirurgia e UTI pediátrica urgente.

Pelos meios normais, a criança foi atendida pelo SUS até que foi emitido um laudo médico de nº 19552 (fls. 19) aos 02/06/11 requisitando a internação e o procedimento cirúrgico.

Daí em diante o atendimento parou e, ante a inércia do Estado, a criança procurou a Promotoria que ajuizou a presente medida aos 12/08/2011 (fls. 05).

Proferi decisão na mesma data (12/08/2011 - fls. 25/26), determinei a intimação do Estado para que informasse em 5 dias qual hospital receberia o infante em internação, sob pena de multa diária de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

O Estado foi regularmente intimado aos 29/08/2011 às 09:43 horas por intermédio do Sr. Secretário de Estado de Saúde que apôs seu carimbo e assinatura às fls. 49, conforme certidão de fls. 50.

Como nada foi feito depois disso, o Ministério Público tornou aos autos aos 07/10/2011 (fls. 33) e solicitou o BLOQUEIO DE VERBAS PUBLICITÁRIAS (ou tributárias, se aquelas fossem insuficientes) para custear a cirurgia do paciente em hospital particular, tudo porque o pai da criança prestou declarações (fls. 34) informando que o médico dissera que se a cirurgia não fosse feita com urgência o filho ficaria com sequelas.

Diante deste pedido, antes de deliberar sobre ele, determinei (pela decisão de fls. 35/37, aos 12/10/2011) a imediata condução da criança e internação compulsória em um hospital de Cuiabá, por meio de uma ambulância da Prefeitura de Juína.

Às fls. 54 consta ofício da Sra. Secretária Municipal de Saúde de Juína, datado de 21/10/2011, informando que o paciente foi levado para Cuiabá mas "não conseguiu internação nos hospitais qualificados", razão pela qual foi colocado na "Casa de Apoio Recanto da Paz" em Cuiabá e a família orientada para procurar o Poder Judiciário".

Este magistrado então, diante do desespero desta família, telefonou para o pai da criança que informou que já estava há uns 10 dias em Cuiabá sem saber o que fazer, aguardando notícias da Secretaria da Saúde, especialmente da servidora "Bruna", que estaria tentando resolver a questão.

Telefonei então ao oficial de justiça que estava com o mandado da precatória em Cuiabá ("Leodemar"), que informou que já havia intimado a "Central de Regulação", mas lhe expliquei a questão, ou seja, que nada havia sido feito e ele, mesmo estando em greve, me informou que então iria buscar a criança onde ela se encontrava e iria tentar interná-la nos termos do mandado.

Veio então a certidão do oficial nesta data (fls. 58), relatando que foi informado pelos médicos dos referidos locais que "no HGU não tem serviço e vaga na UTI infantil; na Santa Casa não tem quadro de neurocirurgião; no Hospital Santa Rosa tem uma criança gravíssima na UTI que não pode ter contato com outras crianças, tendo então se recusado a receber o paciente."

Bem! Diante deste quadro caótico, resta apreciar o pedido de bloqueio de contas do Estado.

Ocorre que, respeitados os doutos entendimentos em sentido contrário, entendo não caber ao magistrado bloquear contas do Estado para realizar qualquer serviço ou comprar qualquer produto que este não esteja fornecendo.

Isto porque a relação entre o Poder Judiciário e o Estado, quando este tem de cumprir decisões daquele quando lhe são determinados pagamentos, segue o mecanismo do precatório, disposto no art. 100 da Constituição Federal.

O que a jurisprudência tem entendido (o que respeito), é que a questão da saúde é de natureza alimentar, daí deve ser paga com preferência como dispõe o § 1º daquele artigo.

Porém ali consta que aquela exceção tem como pressuposto serem os débitos "transitados em julgado".

Ademais, ao se incluir a questão da saúde como "alimentar", por mais relevante que ela seja, está se ampliando a exceção para que ali possa se incluir inúmeras outras hipóteses, como educação, segurança, moradia, etc.

Daí porque, entendo que fora do mecanismo do precatório, a decisão judicial que bloqueia ou penhora bens do Estado, interfere na independência dos poderes (prevista no art. 2º da Constituição Federal) de forma gravíssima e perigosa, a ponto de, em pouco tempo, em nome dos direitos fundamentais, estarmos bloqueando contas do Estado para construir escolas, presídios, centros sócioeducativos, ou outras obras tão importantes para a garantia dos direitos fundamentais do homem.

A situação que se vê atualmente com a saúde em Mato Grosso, longe de ser uma situação excepcional ou momentânea de dificuldade, passou a ser constante e duradoura, pois inúmeros são os pedidos judiciais para internação de pacientes feitos já há mais de ano.

Se, ao que tudo indica, faltam leitos, a construção de mais hospitais é uma decisão discricionária do Poder Executivo, eleito pelo povo para, em seu nome, eleger as prioridades.

O que se constata atualmente são obras de grande porte, como estádios para a "Copa do Mundo", prédios públicos confortáveis e funcionais, como o são os da Justiça do Trabalho, Tribunal de Justiça, Assembléia Legislativa, Justiça Eleitoral, Justiça Federal, Ministério Público, Fórum e muitos outros (de suma importância para o bom funcionamento do Estado e a garantia do estado de direito), compras de veículos, duplicação de rodovias, mas, paradoxalmente, no Estado campeão de rebanho bovino, de plantio de soja, algodão e outras culturas, não se vê prédios da mesma envergadura para atender o ser humano, ou ainda mais, um garotinho de 2 anos de idade que precisa ser internado. Não se vê nem obras em andamento nesse sentido!!!

Aliás, a situação da saúde no Estado foi tema de matéria veiculada a nível nacional na semana passada perante o notório "Jornal Nacional".

Assim, se algo está errado, está na escolha das prioridades, que não cabe, em meu entendimento, respeitados os posicionamentos em contrário, ao Juiz fazê-las, mas ao Político, eleito pelo povo.

Por estes motivos, INDEFIRO o pedido de bloqueio de contas do Estado feito às fls. 33, entendendo que ele fere o disposto no art. 730 do CPC e 100 da Constituição Federal.

Como juiz, órgão do Estado, fiz o que pude, determinando ao próprio Estado que internasse a criança. Se este se nega a internar, justificando falta de leitos, a situação é de calamidade pública, equivalente à situação de guerra.

Assim dispõe a Lei 8.745/93:

"Art. 1º Para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, os órgãos da Administração Federal direta, as autarquias e as fundações públicas poderão efetuar contratação de pessoal por tempo determinado, nas condições e prazos previstos nesta Lei."

"Art. 2º Considera-se necessidade temporária de excepcional interesse público:

    I - assistência a situações de calamidade pública;

    II - assistência a emergências em saúde pública;

    VI - atividades:

    d) finalísticas do Hospital das Forças Armadas;"

Assim dispõe a Lei Complementar 97/99:

    "Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de responsabilidade do Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da Defesa a ativação de órgãos operacionais, observada a seguinte forma de subordinação:

    (...)

    § 1º Compete ao Presidente da República a decisão do emprego das Forças Armadas, por iniciativa própria ou em atendimento a pedido manifestado por quaisquer dos poderes constitucionais, por intermédio dos Presidentes do Supremo Tribunal Federal, do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados."

    "Art. 16. Cabe às Forças Armadas, como atribuição subsidiária geral, cooperar com o desenvolvimento nacional e a defesa civil, na forma determinada pelo Presidente da República.

    Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, integra as referidas ações de caráter geral a participação em campanhas institucionais de utilidade pública ou de interesse social."

Diante destas possibilidades, ante o que dispõe os arts. 98, I e 101, V do Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo em vista a situação da criança, determino a expedição URGENTE, via E-MAIL dos ofícios abaixo para que a situação seja apurada e resolvida pelas entidades competentes:

1. OFICIE-SE ao Exmo. Sr. Presidente do Supremo Tribunal Federal para, se o entender, tomar as medidas que lhe são ofertadas pelo art. 15, § 1º da Lei Complementar 97/99 no sentido de solicitar à Presidência da República o auxílio das Forças Armadas para atendimento desta situação emergencial. Instrua-se o ofício com a cópia desta decisão.

2. OFICIEM-SE por meio de ofício circular a todos os Srs. Deputados Estaduais, Federais e Senadores do Estado de Mato Grosso com cópia desta decisão para ciência e providências que e se entenderem cabíveis.

3. OFICIE-SE ao Ministério Público atuante nesta para que tome as providências cabíveis em face do senhor Secretário de Estado de Saúde de Mato Grosso quanto aos fatos aqui narrados e o que dispõem os arts. 132 e 135 do Código Penal e art. 11, II e 12, III da Lei 8.429/92 e art. 129, II da Constituição Federal. Instrua-se o ofício com cópia integral deste processo.

4. OFICIE-SE ao senhor Procurador Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso para que tome as providências cabíveis em face do senhor Governador do Estado de Mato Grosso quanto aos fatos aqui narrados e o que dispõem os arts. 132 e 135 do Código Penal e art. 11, II e 12, III da Lei 8.429/92 e art. 129, II da Constituição Federal. Instrua-se o ofício com cópia integral deste processo.

5. OFICIE-SE ao Ministério Público Federal em Cuiabá para que tome as providências que entender cabíveis quanto aos fatos aqui narrados, tendo em vista a participação de verbas federais na saúde e o que dispõe o art. 129, II da Constituição Federal. Instrua-se o ofício com cópia integral deste processo.