S E N T E N Ç A
Na Comarca de Ferros, MG, aos 17.MAI.2011, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS ajuizou, em face de DREEN BRASIL INVESTIMENTOS E PARTICIPAÇÕES S.A., do MUNICÍPIO DE FERROS e do ESTADO DE MINAS GERAIS, “ação civil pública” em que postula liminar inaudita altera pars a fim de que: a) se imponha à primeira demandada a obrigação de se abster da prática de qualquer ato tendente à instrução ou ao prosseguimento do processo de licenciamento ambiental da “PCH Ferradura”; b) sejam suspensos os efeitos da declaração do Prefeito de Ferros, atestando a conformidade do empreendimento “PCH Ferradura” com a legislação municipal, bem como demais atos administrativos subsequentes praticados no bojo do processo de licenciamento ambiental; c) suspender o processo de licenciamento ambiental tombado sob o nº 04554/2008/001/2009, em trâmites na SUPRAM – Leste Mineiro, fixando-lhes multa cominatória de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) para o caso de descumprimento, sem prejuízo das sanções penais, civis e administrativas.
Como causa de pedir, informou que se encontra a tramitar, perante a SUPRAM – Leste Mineiro, processo de licenciamento ambiental referente ao empreendimento denominado Pequena Central Hidrelétrica Ferradura (“PCH Ferradura”), tombado sob o nº 04554/2008/001/2009, formalizado por iniciativa da primeira ré, destinado ao aproveitamento do potencial energético do Rio Santo Antonio, em sua parcela situada no Município de Ferros, MG.
Sustentou que a implantação do empreendimento engendrará impactos negativos no meio ambiente natural e cultural da região afetada, tais como: alterações da Área de Proteção Ambiental de Fortaleza de Ferros, objeto da Lei municipal nº 291 e do Decreto nº 1.086, ambos de 2002; destruição de sítios arqueológicos e históricos mediante submersão e soterramento; exposição dos vestígios e descaracterização do entorno e supressão de parte do chamado “Caminho das Esmeraldas”, pertencente à chamada “Estrada Real”.
Narrou que o “Conjunto Paisagístico das Ruínas da Estrada Real e Encontro dos Rio Santo Antônio e Tanque” foi objeto de tombamento municipal, mercê do Decreto municipal nº 1.471, de 2009, e que o Rio Santo Antônio e todos os rios, ribeirões e córregos situados no MUNICÍPIO DE FERROS, por meio de sua Lei Orgânica municipal (artigo 193, inciso II e III), passaram a ser considerados “monumentos naturais”, conforme descritos na Lei nacional nº 9.985, de 2001.
Aduziu que, com a implantação do empreendimento, os mais importantes sítios arqueológicos históricos e pré-histórico de Ferros serão destruídos pela inundação e agravado o meio ambiente natural, abrangendo áreas de relevante potencial para a conservação da biodiversidade, remanescente da Mata Atlântica.
Propugnou que a declaração de conformidade expedida pelo Sr. Prefeito de Ferros, de que trata a Resolução nº 237, de 1997 (artigo 10), encontra-se eivada de nulidade.
À causa deu o valor de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), trazendo à colação alentada documentação (folhas 39-561).
À folha 564, o modelar juiz que me antecedeu no feito, o Dr. AFRÂNIO JOSÉ FONSECA NARDY, determinou a notificação das entidades políticas rés, a fim de que se manifestassem em setenta e duas horas, como de lei.
Fê-lo o MUNICÍPIO DE FERROS às folhas 570-584, por meio de petição da lavra do Dr. SIRLEY DE OLIVEIRA SILVA; o ESTADO DE MINAS GERAIS, às folhas 592-608, por petição da lavra do Exmo. Procurador do Estado Dr. CÉSAR RAIMUNDO DA CUNHA.
É o RELATÓRIO do quanto necessário. Passo a FUNDAMENTAR e DECIDIR.
Como acima referido, o pedido veiculado é no sentido impor ao empreendedor obrigação negativa, qual seja abster-se de instruir ou dar prosseguimento ao processo de licenciamento que deflagrara junto ao órgão ambiental, bem assim a suspensão da eficácia do “decreto municipal de conformidade” e a suspensão do trâmite de processo de licenciamento ambiental.
É que se encontra em andamento, junto ao órgão ambiental estadual, pedido de licença prévia para a instalação da “PCH Ferradura”, de interesse da primeira corré, quem seja a sociedade empresária DREEN BRASIL INVESTIMENTOS E PARTICIPAÇÕES S.A..
Sustenta o Parquet que a implantação do empreendimento revela-se juridicamente insustentável, soçobrando o meio ambiente ecologicamente equilibrado, em todos os seus aspectos.
Informou que, na área diretamente afetada, há, segundo noticiam os autos, bens tombados pela municipalidade, sítios arqueológicos históricos e pré-históricos e área de proteção ambiental intangível, ao seu viso.
Constatou-se também vício no processo de licenciamento, consistente na nulidade da declaração de conformidade do Prefeito, ato necessariamente dele integrante, mercê do artigo 10, §1º da Resolução CONAMA nº 237, de 1997.
Em que pese a relevância dos argumentos expendidos ao longo da bem lançada petição inicial, venho entendendo não há justificativa para a paralisação de regular processo de licenciamento ambiental mediante a declaração judicial, ex ante, de intangibilidade de bens a serem futuramente afetados por empreendimento potencialmente degradador.
Com efeito, é o escopo do processo de licenciamento justamente averiguar a conformidade do empreendimento com as normas ambientais que circundam a matéria, sem prejuízo de que venha a ser o resultado do processo objeto de apreciação judicial, caso verificada alguma ilegalidade.
Cuida-se, pois, de processo de licenciamento in fieri, em gestação junto aos órgãos ambientais competentes, que poderão concluir pela inviabilidade da empreitada por questões atinentes à discricionariedade sui generis imanente a esse tipo de atividade, ou por outras que digam respeito a aspectos jurídico-normativos.
A especial proteção de que desfrutam certos bens, por sua relevância ambiental ou cultural, é estabelecida ope legis, carecendo de declaração judicial a esse respeito, exsurgindo daí falta de interesse de agir.
Configurando, o licenciamento, processo administrativo composto de diversas etapas e no curso do qual participam diversos órgãos e entidades, impedir a sua tramitação seria subtrair do Poder Executivo importante parcela de sua atribuição constitucional.
De outra parte, tem direito o particular de dirigir, junto à Administração Pública, requerimentos que sejam de seu interesse, que serão providos ou não, de acordo com o que ali entender-se, sendo que o resultado final poderá ser submetido à apreciação judicial.
O pedido de licenciamento dimana da garantia constitucional do direito de petição, devendo ser assegurado o direito de resposta ao que fora postualdo.
É claro que não desconheço a absoluta necessidade da presentânea intervenção estatal antes da eclosão do dano ambiental, amiudadas vezes irreversível por sua própria natureza. Nesse viés, a atuação do órgão ministerial é digna dos mais elevados encômios.
Na hipótese em tablado, todavia, não há sequer início de atividade potencialmente degradadora, encontrando-se o processo de licenciamento em seus albores.
Concluído o processo administrativo, poderá ser questionado, inclusive com a paralisação de obras, acaso já iniciadas. Iniciadas as obras à míngua do devido processo administrativo, poderá ela ser judicialmente embargada. O que entendo inviável, repito, é determinar-se a paralisação do processo administrativo que culminará em uma decisão ainda in fieri, posto que diga respeito a bens intangíveis, como acima deixei consignado.
Falta à parte autora, em que pese os elevadíssimos imperativos que a animam, interesse de agir, na modalidade “interesse necessidade”.
Nessa ordem de considerações, extingo o feito sem resolução do mérito (Código de Processo Civil, artigo 267, inciso VI).
Custas: nihil.
Sem condenação na verba honorária, à falta da angularização da relação processual.
P.R.I.
Ferros, XXXXXXXXXXXXX
PEDRO CAMARA RAPOSO LOPES
Juiz de Direito
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