OBS.: Esta sentença foi reformada por acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais cujo caminho eletrônico encontra-se ao pé desta publicaç:
JUSTIÇA
ESTADUAL DE 1ª INSTÂNCIA
COMARCA
DE MARIANA
2ª
VARA CÍVEL, CRIMINAL E DE EXECUÇÕES CRIMINAIS
AUTOS
Nº :
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0400.11.002362-1
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Num.
Única :
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0313259-38.2008.8.13.0400
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AUTOR :
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SAMARCO
MINERACAO S.A.
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ADV.
:
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Drs.
Joao Dacio De Souza Pereira Rolim, Juliano Magno Barbosa e Rodrigo
Luiz Melo Franco Gomes De Almeida
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RÉU :
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ELZA
MARÇAL PINTO E OUTROS
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ADV.
:
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xxxxxxxxxxxxxxxxx
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CLASSE :
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Procedimento
Ordinário
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Assunto :
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CIVIL
> Coisas > Servidão
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Juiz
Prolator :
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Pedro
Camara Raposo-Lopes
|
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A
Na
Comarca de Mariana, MG, SAMARCO
MINERAÇÃO S.A.
ajuizou, aos 03.JUN.2011, “ação de constituição de servidão”
em face de ELZA
MARÇAL PINTO, GIEZE FERREIRA PINTO, TARCÍSIO FERREIRA PINTO, VITOR
MODESTO, GERALDO FERREIRA, PERPÉTUA DAS DORES FERREIRA DE OLIVEIRA,
FRANCISCO PINTO FERREIRA, CONCEIÇÃO APARECIDA FERREIRA, EFIGÊNCIA
LÚCIA FERREIRA, SEBASTIÃO FERREIR NETO
e JORGINA FERREIRA,
no bojo da qual pediu lhe fosse constituído por sentença o direito
de servidão sobre 4,55 ha (quatro hectares e cinquenta e cinco ares)
do imóvel denominado “Jambeiro”, localizado na Cidade de
Mariana, MG, no distrito de Bandeirantes, com área total de 21,1750
ha (vinte e um hectares, dezessete ares e cinquenta centiares).
Como
causa de pedir, aduziu haver sido editada a
Resolução Autorizativa ANEEL nº 2.260, de 2010 por meio da qual
restou autorizado à demandante o acesso, na qualidade de “consumidor
livre”, à Rede Básica do Sistema Interligado Nacional – SIN, ao
fito de permitir a ampliação e realização de melhorias em suas
instalações denominadas “Unidade Germano”, visto que o sistema
de distribuição da concessionária local já estaria atuando nos
limites de sua capacidade operacional.
Corolário, fez o Executivo estadual
baixar, aos 03.FEV.2011, o Decreto de Declaração de Utilidade
Pública para fins de constituição de servidão de áreas
necessárias à passagem de linha de transmissão de acesso à Rede
Básica do Sistema Interligado Nacional – SIN em favor da
demandante, a quem, pelo mesmo ato, foi delegada a promoção da
constituição de servidão administrativa.
Informou que a faixa de servidão
abrange vinte e sete imóveis e que será necessária a realização
de obras ao longo.
Noticiou que as tratativas visando à
instituição de servidão em relação aos corréus restaram
baldadas.
Fundamentou seus pedidos no Decreto nº
38.851, de 1954 e no Decreto-lei nº 3.365, de 1941,
Informou que os agravos a serem
suportados pelo imóvel serviente foram avaliados em R$ 28.980,00
(vinte e oito mil, novecentos e oitenta reais), valor esse atribuído
à causa.
Com a petição inicial vieram os
documentos de folhas 22-270.
Custas recolhidas à folha 272 e 221
(numeração equivocada).
Foi pedida a imissão na posse, tendo
o magistrado que me antecedeu no feito deferido a imediata
constituição da servidão, mediante depósito de quantia
equivalente à avaliação administrativa.
Depósito judicial efetivado à folha
219, tendo sido expedido ofício para o registro imobiliário.
Regularmente citados, quedaram-se
silentes os demandados.
A demandante requereu o julgamento do
feito no estado em que se encontra.
É o
RELATÓRIO
do quanto necessário. Passo a FUNDAMENTAR
e DECIDIR.
Não há nulidades a serem sanadas,
tampouco lobrigo a existência de qualquer delas que deva ser
conhecida de ofício.
Há, todavia, questão prévia que
merece ser apreciada neste comenos.
Como sucintamente relatado, é a
demandante pessoa jurídica de direito privado que se enquadra na
categoria de “consumidor livre”, pretendendo instituir servidão
administrativa ao viso de acessar e seccionar linhas do sistema de
transmissão da concessionária de serviço público de transmissão
de energia elétrica FURNAS – CENTRAIS ELÉTRICAS S.A., na forma do
contrato de conexão ao sistema enganchado nestes autos às folhas
89-149.
Como é cediço, a competência, em
matéria de desapropriação, triparte-se em: competência
legislativa, competência declaratória e competência executória.
Interessa, para o desate da presente
demanda, a chamada “competência executória”, consistente na
legitimidade para promover os atos práticos tendentes a promover a
incorporação do patrimônio privado ao erário, em se tratando de
desapropriação, ou afetação de um bem privado serviente a um
serviço dominante, em se tratando de servidão administrativa.
Peço
vênia para transcrever preciosa ensinança do eminente publicista
KIYOSHI HARADA (in
Desapropriação: doutrina e pratica. - 7. ed. - São Paulo: Atlas,
2007, pp. 59-60), ipsissima
verba,
mas com supressões decorrentes da síntese:
[…]
Podem figurar como sujeito ativo da desapropriação quaisquer
entidades politicas componentes da Federação, isto é, a União, os
Estados, os Municípios e o Distrito Federal, que detêm o poder de
desapropriar. Os concessionários de serviços públicos e os
estabelecimentos de caráter público ou que exerçam funções
delegadas de poder público, também, podem expropriar, desde que
expressamente autorizados por lei ou contrato […]
Importante
frisar que poder expropriatório original só detêm as entidades
políticas componentes da Federação. Tanto os concessionários de
serviços públicos, como os estabelecimentos de caráter público,
assim entendidas as pessoas jurídicas que exercem, por delegação,
as atribuições do Poder Público, só
podem desapropriar mediante autorização legislativa ou contratual.
Em outras palavras, a entidade política competente concede ao
concessionário ou delegado de Poder Público a faculdade de
desapropriar os bens necessários ao desempenho de suas obrigações
legais e contratuais, isto é, a execução do serviço público.”
(original sem grifos)
Tal é a inteligência do artigo 3º
do Decreto-Lei nº 3.365, de 1941, cuja redação encontra-se vazada
nos seguintes termos:
Art.
3º Os concessionários
de serviços públicos e os estabelecimentos de caráter público ou
que exerçam funções delegadas
de poder público poderão promover desapropriações mediante
autorização expressa, constante de lei ou contrato. (original sem
grifos).
Na
hipótese vertente, arrima-se a demandante no Decreto estadual s/nº,
de 02 de fevereiro de 2011, o qual, deveras, em seu artigo 3º,
autoriza a autora a “promover
a constituição de servidão dos terrenos descritos no Anexo
podendo, para efeito de imissão na posse, alegar a urgência de que
trata o art. 15 do Decreto-Lei Federal nº 3.365, de 1941.”
Entretanto, a autorização mencionada
no indigitado decreto não atende ao quanto disposto no Decreto-Lei
nº 3.365, de 1941.
É
que, em se tratando de servidão administrativa, caem por terra os
conceitos civilísticos de “bem dominante” e “bem serviente”.
Há, é verdade, sempre um bem serviente, mas “dominante” será,
em toda e qualquer hipótese, um serviço público, como pontifica o
nunca assaz lembrado RUY CIRNE LIMA, em lições que ainda guardam o
viço original (Das servidões administrativas. In
Revista de Direito Público, nº 5, jul/set 1968, p. 26.), verbatim:
[coisa
dominante, na servidão administrativa] é “o serviço público, ou
seja, a organização de pessoas e bens constituída para
executá-la”, [sendo que] “a noção de serviço público não
implica necessariamente a da propriedade de um imóvel, no qual a
organização assente o seu funcionamento, e em favor do qual a
servidão administrativa se constitua”.
Em
se tratando de serviço público de energia elétrica, compete à
UNIÃO a exploração direta ou mediante autorização, concessão ou
permissão, ex
vi
do artigo 21, inciso XII, alínea “b” da Lex
Legum.
Nem se diga ser a demandante
autorizada de serviço público, porque tal categoria, de resto
controversa na doutrina pátria, tem seus destinatários
identificados no artigo 7º da Lei nº 9.074, de 1995, quem sejam os
autoprodutores autorizados a operarem termelétricas de potência
superior a 5.000 kW ou potenciais hidráulicos entre 1.000 kW a
10.000kW.
Tratando-se
os concessionários, permissionários e autorizados de serviços
públicos de energia elétrica os únicos aptos a figurar como
delegatários da competência executória de instituição de
servidões, submetem-se aos ditames da Resolução Normativa ANEEL nº
279, de 2007 sem
prejuízo da necessária delegação legal ou contratual.
O
caso sub
examine
é, repita-se, de particular
consumidor livre de serviço de energia elétrica
que não produz um único kW de energia elétrica, em relação a
quem se aplicam tão somente os ditames do Decreto nº 5.597, de 2005
o qual regulamenta o acesso de consumidores livres às redes de
transmissão de energia elétrica e cuja autorização nada tem a ver
com autorização de serviço público, tratando-se de mero ato de
consentimento mais condizente com o exercício da polícia
administrativa.
Tampouco mostra-se aplicável à
hipótese vertente o Decreto nº 35.851, de 1954, o qual abarca sob o
seu guante normativo tão-somente os concessionários para o
aproveitamento industrial das quedas d'água, ou, de modo geral, para
produção, transmissão e distribuição de energia elétrica.
Caberia exclusivamente a FURNAS –
CENTRAIS ELÉTRICAS S.A., também interessada no contrato de conexão
ao sistema de transmissão, a promoção da instituição de servidão
administrativa, mediante ressarcimento de encargos, conforme disposto
em contrato.
Nessa
ordem de considerações, reconheço a ilegitimidade ativa da
demandante e, por conseguinte, extingo
o feito sem resolução do mérito,
na forma do artigo 267, inciso VI do Código de Processo Civil
brasileiro.
Condeno a demandante nas custas
processuais. Deixo de condená-la em honorários advocatícios, à
míngua de contraditório.
Revogo a liminar e, corolário,
determino a expedição de mandado ao registro de imóveis, a fim de
que se cancele o registro com base nela efetivado.
Expeça-se alvará de levantamento em
prol da demandante, relativamente à quantia depositada à guisa de
depósito prévio.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Mariana, 22 de janeiro de 2013
PEDRO CAMARA RAPOSO-LOPES
Juiz de Direito